A TENDÊNCIA DOS CONFLITOS
ARMADOS
Martín Chahab [1]
1. Conflitos entre Estados [2]
No transcorrer das duas guerras mundiais do
século XX a humanidade perdeu mais de 70 milhões de vidas: a partir de 1945 até
a queda da União Soviética, os 40 anos de Guerra Fria, morreram no planeta
cerca de 17 milhões de pessoas em conflitos armados e de 1990 até 2003 as
guerras levaram mais de 3 milhões de vidas (Marshall: 2003). No total os
conflitos armados do século XX provocaram cerca de 90 milhões de vítimas
fatais.
Todavia a tendência de baixas em conflitos
armados vem diminuindo, embora a quantidade destes conflitos tenha tomado uma
direção inversa: desde o fim da Segunda Guerra Mundial vêm sendo deflagrados
muito mais conflitos armados em todo o planeta do que em séculos anteriores e
essa tendência parece se acentuar cada vez mais. Em síntese, o século XXI está
delineando-se como um mundo em constante conflito porém com menos vítimas
fatais que nos séculos anteriores.
Nesta análise definimos conflitos como o
choque de interesses, ou posições diferentes, sobre valores nacionais, que
venha a ter alguma duração e magnitude significativa entre ao menos duas partes
(grupos organizados, Estados, grupos de Estados, organizações) que estejam
determinadas a perseguir estes interesses e o farão.
Estes conflitos estão tipificados dentro
das seguintes categorias:
Territorial
Secessão
Autonomia
Ideológico/sistêmico
Poder nacional
Predomínio do poder regional
Poder internacional.
Recursos.
A intensidade dos conflitos varia desde os
não violentos até os violentos. Dentre os não violentos estão os conflitos
latentes e os conflitos manifestos. Dentre os
violentos estão as crises, as crises severas e as guerras.
Essas definições e categorizações foram
adotadas visto serem as mais aceitas pela comunidade internacional que analisa
a problemática dos conflitos. Por fim também podemos definir guerra usando o
Direito Internacional Humanitário: guerra é toda luta armada entre dois ou mais
Estados.
Uma
forma de se entender essa relação antagônica entre, a quantidade de mortos em
conflitos e o número desses conflitos através dos tempos, é levantar uma
hipótese vinculando a estrutura do sistema internacional com os conflitos
armados: “quanto mais Estados concentrarem o poder nas relações internacionais
mais conflitos armados haverá no mundo e ao mesmo tempo mais mortes serão
produzidas por eles.” Isto nos leva até uma hipótese complementar muito
sugestiva: “em um mundo bipolar se produzirão menos conflitos armados entre os
Estados e consequentemente menos vítimas fatais”. Se observarmos as estatísticas
históricas veremos que o sistema internacional, finalizado ao término na
Segunda Guerra Mundial, provocou mais de 70 milhões de mortos só no século XX,
que o sistema bipolar durante a Guerra Fria gerou 16,5 milhões de baixas em
conflitos armados e que o atual sistema unipolar regido pelos Estados Unidos
reduziu as mortes à cifra de 3 milhões em pouco mais que uma década, quando o
número deveria ter sido, segundo a mesma tendência da Guerra Fria, quase 5
milhões de mortos.
A que isso nos leva? Podemos interpretar esses
dados no sentido de que a humanidade cuida melhor de si mesma quando existe
ruma concentração de poder em um só Estado, que quando da existência de um
poder hegemônico que controla os demais Estados há menos guerra entre eles e,
em conseqüência, menos mortes. Não podemos negar essa vinculação que temos
feito entre as modificações do sistema internacional, a quantidade de conflitos
armados entre Estados e a quantidade de mortos. O sistema unipolar mostra que
existem menos conflitos armados entre os estados do sistema internacional.
Por outro lado podemos interpretar esta
tendência dos conflitos armados no mundo atual injetando novas variáveis e a
questão já não se apresentará tão simples e unidirecional como parece. Na
realidade existem mais conflitos armados no mundo de hoje que nas etapas
anteriores, mas os tipos de conflitos vêm variando. Desde o fim da Guerra Fria observamos o crescimento dos conflitos
dentro dos Estados, ou intra-estatais, enquanto os conflitos entre Estados ou
inter-estatais têm mantido a mesma freqüência de antes de 1990. Se entre 1946 e 1989 existiram 718
conflitos intra-estatais, nos mais de 13 anos que vão desde 1990 ate 2004
ocorreram 429 situações semelhantes e morreram pessoas em conflitos armados. Se
a freqüência atual fosse a mesma que na Guerra Fria teríamos 207 conflitos
armados intra-estatais, porém a cifra é maior que o dobro. Isto quer dizer que
a lógica que guia estes conflitos modificou-se. Há mais conflitos dentro dos Estados
pós Guerra Fria. Enquanto há mais paz
entre os Estados do sistema internacional, há mais guerra dentro das sociedades
dos Estados.
Existem várias razões para isso. Heidelberg Institute on Internacional Conflict Research, em sua publicação anual do Barômetro dos Conflitos, vem mostrando que O muitos destes conflitos interestatais no mundo estão sendo resolvidos em nível de latência através de negociações e que cada vez um menor número deles chega a uma crise armada, muito menos a uma crise severa e menos ainda os que terminam em guerra ou conflito armado. Esta pode ser uma razão importante para se entender o porquê da diminuição dos conflitos armados entre os Estados e o mundo. À primeira vista pareceria que a cooperação entre os Estados vem impedindo que possíveis guerras venham a eclodir, mas na verdade o que tem evitado que muitos conflitos passem da categoria de não violentos a violentos tem sido o trabalho de várias organizações internacionais tais como: Nações Unidas, Organização dos Estados Americanos, União Européia, Comunidade Econômica e Monetária Central, Comunidade Econômica dos Estados do Ocidente, e Organização pela Segurança e Cooperação na Europa, entre outras. Isto se pode observar no gráfico 4, à título de exemplo.
Uma terceira hipótese que nos permitiria explicar
esta diminuição da quantidade de conflitos interestatais é inserir a variável
tecnológica em um contexto de profunda interdependência e globalização entre
os Estados.
De alguma forma, que investigaremos agora,
existe uma dimensão “mundo global” que poderia estar estruturando a dimensão
“sistema internacional” de uma maneira cada vez mais profunda. Como sabemos, a
globalização (Beck: 1998 ) tem como um de seus pilares mais fortes o
desenvolvimento tecnológico aplicado principalmente ao comércio mundial: a
maior capacidade tecnológica dos Estados gera maior capacidade para fazer frente
aos desequilíbrios apresentados pela globalização e maior capacidade de
comercio. Assim as forças de um país que concentre maior capacidade tecnológica
podem ter, no futuro, a possibilidade de determinar as lógicas e regras, não só
do mundo globalizado (tecnologia e comércio), mas também as relações entre os
Estados.
Portanto a tendência atual dos conflitos
armados interestatais no mundo já não se vincula, como antigamente a interesses
dos Estados, tais como território, soberania ou política do poder, mas sim ao
desenvolvimento tecnológico e supremacia comercial, e essa disputa pelo domínio
da tecnologia tampouco se relaciona com a industria da guerra e sim com a
capacidade de controlar o comércio internacional. Temos então uma nova
premissa: quanto maior o comércio mundial baseado na cooperação entre os
Estados, menor a quantidade de conflitos
armados interestatais e em conseqüência menor quantidade de mortos. O que vem a
ser o mesmo que dizer, maior
desenvolvimento tecnológico mais comércio mundial, menos guerras interestatais,
menor quantidade de mortos.
O
que observamos até aqui é a ocorrência de uma troca significativa na tendência
dos conflitos entre os Estados trazendo consigo uma mudança também
significativa nos sistemas de segurança individuais e coletivos, portanto,
neste cenário se faz importante repensar para que existem os sistemas de defesa
dos Estados e de grupos de Estados. No
atual contexto a explicação derivaria da existência de novas ameaças como o
terrorismo internacional, a produção de armas de destruição em massa, etc. Porém
essa é uma analise incompleta da questão e não caracteriza tendências em longo
prazo, alem de simples explicação contextual. Temos nos concentrado em demasia
no ataque às torres gêmeas e deixado de perceber as políticas de poder que subsistem
e seguem vicejando no subsolo. Temos tentado sair demasiado rápido dos
paradigmas tradicionais das relações internacionais e da análise defensiva
talvez pelo forte impacto emocional produzido em todo o mundo quando do ataque,
mas também por novas teorias sobre as tendências dos conflitos armados.
Vejamos uma delas. Suponhamos um novo paradigma
das relações internacionais pós Guerra Fria: o choque das civilizações. Segundo
essa teoria as novas guerras estariam vinculadas ao enfrentamento entre as diferentes culturas do mundo. Huntington
(1993a) expõe em seu trabalho que a civilização ocidental teria, no futuro, que
se enfrentar não só com a civilização muçulmana mas também com uma aliança entre
muçulmanos e confucionistas (China), que buscaria destruir a supremacia
ocidental e cristã. As guerras do futuro seriam culturais centradas no aspecto
religioso. Porém, com base no artigo de Andrej Tusicisny (2004), observamos
que, utilizando as categorias de análise de Huntington
dos conflitos entre as diferentes civilizações, não se produziu o que o autor
havia suposto em seu famoso e sugestivo artigo e tampouco existem indicadores
de que isso vá acontecer. Ao contrario, os conflitos têm aumentado dentro de
uma mesma sociedade enquanto o numero deles, produzidos entre sociedades
distintas, tem se mantido constantes.
O que se pode observar é que os Estados
Unidos provocou, durante a Guerra Fria mais de 80% dos conflitos entre a
civilização ocidental e as demais civilizações, sem considerarem-se os choques
diretos deste com a União Soviética e os processos de descolonização na África
e Ásia. Desde a queda do muro de Berlim o mesmo Estados Unidos vem gerando mais
de 50% dos conflitos entre a civilização ocidental e as demais. Caberia-nos
corrigir a Huntington no sentido de afirmar que não é a civilização ocidental
que enfrentará, no futuro, as outras culturas, mas sim que os Estados Unidos
enfrentará as demais culturas de forma unilateral ou formando alianças
ofensivas.
Neste sentido e tomando-se as definições de
civilizações utilizadas pelo autor concluímos que os Estados Unidos tem
enfrentado em conflitos armados, nos últimos 20 anos, a dois tipos de culturas:
a muçulmana e a latino-americana. Os Estados Unidos enfrentou a Líbia em 1986,
o Panamá em 1989, o Afeganistão em 2001 e 2002 e o Iraque na guerra do Golfo em
1998 e em 2003.
Portanto concluímos que quanto maior o
desenvolvimento tecnológico mais comércio mundial, menos guerra entre Estados e
menor quantidade de mortos. Conseqüentemente passou-se a acreditar que o
comércio mundial é que tem freado os conflitos entre Estados, porém devemos
observar que este aumento do comércio mundial está embasado no desenvolvimento tecnológico.
Entretanto, o crescimento do PIB de diferentes Estados está baseado em uma
maior ou menor exploração de recursos naturais em todo o mundo, e este
desenvolvimento tecnológico, por sua vez, tem sido possível graças a exploração
dos recursos naturais não renováveis, como o petróleo e o gás. Enquanto tecnologia
e comércio mundial avançam esgotam-se os recursos naturais que sustentam este
crescimento. Neste sentido, se a humanidade não modificar sua estrutura
dependente destes mesmos recursos esgotáveis que fazem funcionar suas indústrias
e meios de locomoção, podemos acreditar que haverão choques entre Estados
diferentes na busca destes recursos.
Porém a questão não pode ser discutida
apenas em termos de modernidade; o cenário realista das relações internacionais
tem sido invadido por novos atores: as empresas transnacionais e organismos
internacionais. A menos que os Estados Unidos sejam os representantes
exclusivos destas empresas globais, o que sabemos não ser verdade. Estes novos
atores, que em parte dominam o mundo global (já que pensamos que não o fazem
sobre o sistema internacional), também necessitam de recursos naturais dos
Estados onde se localizam para atender e sustentar seus interesses. Se
supuséssemos que Estados como Estados Unidos, Inglaterra, Espanha, França,
Alemanha, Austrália, Canadá, dentre outros, representam estas empresas então poderíamos
concluir que são os interesses das companhias globais que poderiam estar fomentando
conflitos armados contra Estados que detenham recursos naturais em abundância
como foi o caso da invasão dos Estados Unidos ao Iraque. Porém não fizemos essa
suposição, portanto a deixaremos de lado.
Os paises desenvolvidos têm crescido não
mais que 3% ao ano. Dois paises, China e Índia, vêm crescendo de forma
sustentada acima de 7% ao ano, e ambos têm uma dependência imensa de petróleo e
gás, tal qual os paises desenvolvidos. Se refletirmos de forma realista sobre
esta situação, podemos supor que rapidamente acontecerá um enfrentamento entre
China e Índia e os paises desenvolvidos em busca destes recursos naturais,
porém isso não seria provável em vista do atual cenário de interdependência e
globalização. Tanto a China como a Índia têm mantido uma relação externa direta
com os paises mais desenvolvidos do mundo,
como os Estados Unidos, Japão, Alemanha e França e o comércio bilateral
de ambos com estas potências tem crescido
a níveis nunca vistos. As empresas multinacionais destes paises vêm se
instalando nos gigantes da Ásia e a China é o segundo possuidor de bônus dos Estados
Unidos. Nesse sentido a cooperação econômica tem desempenhado um papel fundamental
para que esses laços econômicos entre paises do ocidente e oriente evitem
questões que gerariam algum tipo de crise.
Porém a cooperação só é possível em um
mundo de abundância. Na escassez não há amigos, só existem rivais. Como sabemos
as reservas de petróleo e gás do mundo tem seus dias contados. A menos que se
ponham a disposição tecnologias que funcionem com outros tipos de energia e que
haja uma transferência tecnológica mundial poderão reaparecer conflitos típicos
por recursos naturais escassos que já sacudiram a humanidade em toda sua
historia. Esse tipo de conflito
armado, já antigo e ao mesmo tempo novo, poderia reaparecer no planeta, já não
só entre Estados rivais, mas também com novos atores como os exércitos privados
das grandes companhias multinacionais que buscariam defender seus interesses.
A cooperação e o comércio mundial têm seus
limites fixados na base de seu próprio desenvolvimento. Ainda que se possa
pensar que, graças ao avanço tecnológico, a humanidade escapará da dependência
dos recursos naturais escassos por outro tipo de energia, é importante lembrar
que existem demasiados interesses atrapalhando esse caminhar.
2. Aumento dos conflitos intra-estatais
Até
agora discutimos pouco acerca do aumento dos conflitos intra-estatais e mais do
aumento da cooperação como marco da globalização. É preciso que se entenda que
embora aconteça menor número de mortos nas ultimas décadas, os conflitos dentro
das sociedades vêm aumentando.
Finalizada a Segunda Guerra Mundial a comunidade internacional se viu comovida
pelos conflitos armados vinculados a colonização da África e Ásia, que acabaram
por englobar a maior parte dos choques entre os paises do ocidente e as demais
civilizações. Como já dissemos antes a quantidade desses conflitos entre paises
distintos decresceu substancialmente em relação às guerras da primeira metade
do século XX. Ao fim da Guerra Fria os conflitos inter-estatais mantinham a
mesma freqüência que durante a contenda entre Estados Unidos e União Soviética.
A partir da instalação do sistema bipolar podemos observar a intensificação dos
conflitos vinculados não só a uma oposição a autoridade estatal e ao poder
global, como também o aumento dos conflitos vinculados aos recursos naturais.
Por outro lado a intensificação da violência nos conflitos manifesta-se
particularmente nos que se vinculam a luta pelo poder nacional e é a África o
continente onde os conflitos violentos mais se evidenciam seguida pela Ásia e
Oriente Médio. Neste sentido tratamos de sociedades mais conflituosas e
desorganizadas e a uma mudança traumática. “Os
paises menos desenvolvidos apresentam conflitos mais violentos que os paises
desenvolvidos”. Assim conflitos políticos e uma grande quantidade de crises
étnicas se têm manifestado nessas regiões (Gurr, Marshall e Khosla: 2001).
Paralelamente os conflitos vinculados a uma
oposição ideológica têm aumentado nos últimos anos da década de 2000 e é de se
esperar que este tipo de conflito continue aumentando. Porem não os encontramos
em todo o mundo, mas sim especificamente nos paises em vias de desenvolvimento,
como na América Latina em paises como Argentina, Venezuela e Colômbia. A Ásia é
a região que vem apresentando maiores conflitos ideológicos nos últimos anos,
como os casos da China, do Laos e Camboja. Também sucede o mesmo no Oriente
Médio, especificamente nos enfrentamentos entre Estados Unidos e Israel com os
paises árabes. É muito provável que as causas do terrorismo internacional sejam
mais ligadas a este tipo de conflito que a outras causas. O fenômeno interessante
é sua expansão para além do território no qual têm sua origem. Porem isto de
maneira alguma significa, como tentou assegurar Huntington, que a oposição ideológica
seja uma oposição cultural entre civilizações distintas.
Assim, “os paises em vias de desenvolvimento têm mostrado, nos últimos anos,
conflitos vinculados à rejeição ao sistema internacional e a globalização econômica”.
Por outro lado o mundo desenvolvido tem
estado vinculado a três tipos de conflitos: os problemas de secessão internos,
rejeição ao poder internacional e a disputa por
recursos naturais. Do primeiro tipo temos exemplos como o problema Basco na
Espanha, a Grã Bretanha com o IRA e o Canadá com Québec. Do segundo tipo todas
as pressões aos paises em desenvolvimento pelo controle de armas e energia
nuclear, como o caso da Coréia do Norte. Finalmente, nos tipos de conflitos
pelos recursos naturais encontramos a invasão dos Estados Unidos ao Afeganistão
e ao Iraque. Neste sentido “os países desenvolvidos
têm participado em conflitos armados vinculados a permanência do status quo nas
questões domésticas e internacionais”.
A característica na Europa desenvolvida é o conflito relacionado a secessão
de grupos que buscam afastar-se do controle do Estado Central. Nos países
europeus, ex participantes da União Soviética, o conflito típico é a busca de
autonomia.
Cenários
possíveis e conclusão
A Ásia vem sendo nos últimos anos a região
a mais apresentar conflitos no mundo, mas, ao mesmo tempo, é a região do mundo
que mais cresceu em termos econômicos. Uma das razões desta contradição entre
crescimento econômico e quantidade de conflitos pode ser a provocada pela
cartilha da globalização econômica no sentido em que as grandes empresas buscam
regiões do planeta próximas à situações de pobreza, mas não pobres, para
instalar indústrias antes situadas em regiões desenvolvidas. Esta nova tendência
da economia mundial pode ter provocado na Ásia a grande quantidade de conflitos
que vêm se desenvolvendo nos últimos anos. A globalização econômica está
causando, não só na Ásia mas sim em toda a Europa, conflitos de secessão dentro
dos Estados. Se juntarmos os conflitos que estão relacionados com crises
internas (secessão, autonomia, ideológicos e poder nacional) e os compararmos
com os que se relacionam com o fator internacional (poder regional, território,
poder internacional e recursos) vamos verificar que, como já dissemos,
intensificaram-se os conflitos dentro dos Estados em relação aos conflitos entre
os Estados. Esta pode ser uma tendência que venha a se reverter se em algum
momento esse crescimento econômico se transformar em poder político internacional,
especialmente em casos como China, Índia e Japão.
A África tem sido sacudida já há várias décadas por conflitos
relacionados a fatores internos como a luta pela conquista do poder do Estado
por vários grupos diferentes. Porem isto não é um fator independente, a luta
pelo poder em paises africanos está intimamente relacionada com a luta pelos
recursos naturais em relação ao processo de colonização européia e sua
posterior descolonização. Neste sentido o continente africano não tem
conseguido se desvencilhar de lutas
extremamente violentas visto que a lógica que predominou durante o período
colonial parece ainda perdurar impedindo o crescimento econômico. Do ponto de
vista dos conflitos armados a África está, todavia, colonizada.
A América, mais especificamente a América Latina, é uma região que pode
ser situada dentro dessa análise de conflitos armados da Ásia e da África, embora
não tenha crescido economicamente como aconteceu com a Ásia e também não mostrar
a violência da África. A luta pelo território e poder nacional tem mantido uma freqüência
histórica na América Latina. Além do caso da Colômbia, começam a aparecer
conflitos relacionados ao desequilíbrio produzido pela globalização econômica
como costumam ser os conflitos do tipo ideológicos vinculados ao processo de
privatizações acontecidos durante a ultima década do século XX. Assim como na
Ásia, a América Latina apresenta mais conflitos intra-estatais do que inter-estatais.
A tendência será que os conflitos territoriais comecem a minguar,
principalmente pela forte atitude latino americana em ser uma zona de paz, porém
isso não deixa de lado a possibilidade de um aprofundamento nos enfrentamentos
ideológicos e que se acirrem as lutas pelos recursos naturais vinculadas ao desenvolvimento da Ásia.
A Europa apresenta dois aspectos visíveis perante esta análise; a Europa
desenvolvida, a qual podemos vincular a dois tipos de conflitos: um, ligado a
intensificação da força secessionária que tem impulsionado o processo de
globalização, como são os conflitos da Espanha, França e Grã Bretanha, mas que
tem demonstrado grandes possibilidades de soluções graças ao trabalho das
organizações internacionais e a uma política de pacificação interna; dois,
vinculado a participação de alguns paises em conflitos por recursos naturais e
a poder internacional, como Afeganistão, Iraque e Chechenia.
A Europa em vias de desenvolvimento, especificamente os paises da ex
União Soviética, tem estado vinculada a conflitos territoriais e de autonomia.
Neste caso o processo de descolonização econômica e política não têm mostrado a
violência africana; é muito provável que este tipo de conflito acabe por minguar
na medida em que sejam absorvidos pela parte desenvolvida do continente.
Sobre o Oriente Médio, questão que não
pretendemos abordar amplamente nesse trabalho visto sua complexidade de problemas,
podemos afirmar que a região tem concentrado conflitos sobre poder tanto
nacional, regional como internacional. Existe uma forte oposição ideológica
entre a visão árabe do mundo de um lado e a israelita e ocidental de outro.
Finalmente
devemos esclarecer aqui que nossa proposta não é uma análise exaustiva sobre a
questão do terrorismo internacional já que o temos tomado como uma resposta ao
tipo de conflito ideológico, o que parece coerente com a presente perspectiva.
A lógica dos conflitos armados no mundo sofreu uma variação quantitativa
e qualitativa. Vemos hoje mais conflitos armados que em outras épocas da
história porém com menos violência e menor quantidade de mortos. Ao mesmo tempo
os mecanismos de negociação parecem estar fazendo um bom trabalho ao frear
muitas crises antes que se chegue a situações de violência. O que podemos
evidenciar é que mais pobreza significa
mais violência e esta violência é resultado de um gesto voluntário do ser humano e não uma
questão natural e imutável. A humanidade pode decidir ter mais ou menos guerras
ao decidir distribuir as riquezas entre os povos que fazem parte dela. A
globalização econômica, social, cultural e política do planeta e um modelo único
de sociedade não é solução para a pobreza do mundo e muito menos solução para
conflitos armados; pelo contrario pode ser um fator que aprofunde as
desigualdades e acelere a violência. Porém pode ser também que aproxime mais os
povos através da cooperação e do entendimento para solucionar as crises de
pobreza que hoje a maior parte da humanidade atravessa. Embora, na verdade,
existam pessoas que se divertem vendo mortos em conflitos armados a maioria das
pessoas busca a paz como um estado desejado e possível em suas vidas. Neste
sentido a paz é possível enquanto existirem vontades que busquem sua construção
e estabilidade.
O desenvolvimento econômico dos povos pode
resultar em menos violência, porem
acelera a luta mundial em torno da busca de recursos naturais. Este é o desafio imenso que têm os paises desenvolvidos
e as grandes economias em crescimento. O resultado será, evidentemente,
dependente do grau de entendimento e sentido comum que tenham os que vão tomar
decisões que afetarão todo o planeta. A forma do sistema internacional pode
influir em algumas tendências dos conflitos armados, como vimos ao inicio dessa
análise, mas é só uma influência, não uma determinação. A vontade dos povos em
busca da paz ou da guerra é a grande determinante que estrutura esta questão. A responsabilidade sobre a guerra ou a paz
não é do sistema internacional, da globalização, nem da cultura, dos genes, da
religião, nem de Deus. A responsabilidade é do ser humano. Haverá paz se o
homem decidir por ela e haverá guerra se ele também decidir.
BIBLIOGRAFIA
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es la globalización? (Barcelona:
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www.incore.ulst.ac.uk:
International Conflict Research.
www.konfliktbarometer.de:
Heidelberg Institute on International Conflict Research
[1] O autor é cientista político, licenciado
pela Universidad de Buenos Aires e
mestre em Defesa Nacional, pela
“Escuela de Defensa Nacional”, da Argentina. martinchahab@hotmail.com Tel. (+54
11) 4899-0375 e : martinchahab@yahoo.com.ar
Tel. (0237) 462-3200
[2] A tradução do original em espanhol para o português
foi feita pela escritora Vera do Val.