FHC E SEU
CAVALLO (DE TRÓIA)
Paga a Argentina o crime de ter seguido, às últimas
conseqüências, as ordens do FMI. Vendeu tudo, manteve a paridade do peso com o
dólar, queimou suas reservas, sucateou suas indústrias. E quebrou!!!
Recentemente, um dos ministros do Governo Fernando Henrique, deputado
Arthur Virgílio, em entrevista agressiva nos jornais, criticava o silêncio da
esquerda brasileira diante da crise Argentina. Insinuava ele que era preciso
reconhecer que o Governo FHC tinha acertado, enquanto o Governo argentino
errara.
Vejamos a realidade dos fatos.
Uma das grandes diferenças entre Argentina e Brasil foi a intensidade do
massacre sofrido pela esquerda Argentina, durante a ditadura militar. Se aqui a
ditadura assassinou cerca de trezentos brasileiros, lá foram 20 mil argentinos,
numa população quatro vezes menor. Houve um massacre dos resistentes, entre
eles alguns dos mais competentes quadros da esquerda do país irmão.
Sobraram,
na Argentina, com alguma organização, o peronismo populista e os conservadores.
No Brasil, temos um PT com 30% de apoio aproximadamente, além do PSB,
PDT, PCdoB, PCB, PPS, a esquerda do PMDB e mesmo setores do PSDB, onde
sobrevivem segmentos com alguma história de luta ao lado da esquerda. Além
disso, outras entidades não parlamentares da sociedade civil têm tido
participação expressiva, como MST, CUT, OAB, ABI e as organizações
profissionais mais expressivas.
Não é essa a situação da Argentina.
Em plena crise, ouvia-se falar apenas dos governadores peronistas, do
ex-presidente peronista Menem, e nada de uma esquerda organizada, como saída.
Discutia-se qual deles assumiria. Alternativa mais séria, não se aventava,
embora o povo nas ruas pedisse mais do que a substituição dos mesmos pelos
iguais. Daí a dificuldade de estabilização dos cinco presidentes em uma semana,
pois nada de novo representavam para a população que, nas ruas, com caçarolas,
e não fuzis, pedia mudança mais profunda.
É preciso deixar claro que, se o Governo FHC não seguiu completamente,
às últimas conseqüências, o modelo do FMI, como fez a Argentina, isso se deve
ao papel da esquerda brasileira. O mérito é dos que, desde o início, criticaram
a mentira do real supervalorizado, dos últimos meses do primeiro governo FHC.
Foi a esquerda brasileira que criticou o papel triste de Gustavo Franco,
presidente do Banco Central e homem de absoluta confiança do presidente FHC e
do ministro da Fazenda Malan, mantendo o real superaquecido enquanto perdíamos
divisas, num processo de importação predatório, onde eram atingidas nossas
indústrias e nossos empregos. A direção da FIESP também teve papel importante
na luta contra o sucateamento de nossa indústria.
Foi a esquerda brasileira que impediu a venda da Petrobrás, de Furnas e
do pouco que sobrou. Não tivemos força para manter a Vale do Rio Doce, a Light
ou a Embratel. O Sistema Elétrico Brasileiro, de que devíamos nos orgulhar pela
beleza da operação interligada, que uniu todo esse Brasil de 8,5 milhões km2,
esse Sistema Elétrico foi desestruturado, raiz da crise que veio a estourar
adiante, para surpresa do presidente FHC. A crise no setor elétrico foi maior,
porque nele foi-se mais a fundo no cumprimento das ordens do FMI. Nesse setor,
o comando esteve com o PFL, nossos Cavallos e Fernandos de la Rua. Aí, a
entrega foi total, antes mesmo de se constituírem as agências reguladoras. O
Ministro Sérgio Motta, com outra origem política, foi mais cauteloso no setor
de telecomunicações.
Foi a esquerda brasileira que impediu a entrega total de nossas maiores
empresas estratégicas. Na Argentina, a Petrobrás de lá (YPF) já é uma empresa
espanhola, REPSOL. O Gustavo Franco de lá, o ministro Cavallo, foi até o final
em sua missão. Quase nada sobrou.
É preciso dizer, com todas as letras, que foi nossa esquerda, os sobreviventes
da luta contra a ditadura, a nova esquerda que surgiu com o PT, os companheiros
do PCB, PCdoB, PSB, PDT, PPS e os remanescentes progressistas que ainda existem
nos outros partidos que impediram que se entregasse tudo.
Não tem de que se orgulhar o governo FHC. Nossa economia está sendo
gerenciada por dívidas interna e externa impagáveis. E, se não foi pior, é
porque não pode executar até o fim a missão. O estrago que fez não foi total.
* Raymundo de Oliveira é professor do
Instituto de Matemática da UFRJ e foi presidente do Clube de Engenharia
1994/97, subsecretário de Saneamento do RJ 1999/2000, presidente da CEDAE
1993/94, presidente do PRODERJ 1991/92 e Deputado Estadual 1979/83.