1 - Considerações Iniciais
Kant
escreveu relativamente pouco sobre política pragmática, mas a sua notável
exceção foi o ensaio acerca da Paz
Perpétua (1795), quando este filósofo alemão elaborou um consistente
projeto de federalismo mundial. Neste, ademais, postulou uma forma
relativamente democrática de governo, inserida no contexto republicano de
participação política, assim como de necessidade primordial do desenvolvimento
de um novo Direito Internacional, fundando em um conjunto de normas superiores
coercitivas e oponíveis aos Estados.
Nos dias de
hoje, observa Octavio Ianni em sua análise sobre o advento da nova ordem
mundial,
o dilema consiste em constatar se está ou não
havendo uma ruptura histórica em grandes proporções, em âmbito global,
assinalando o declínio do Estado-nação e a emergência de novos e poderosos
centros mundiais de poder, soberania e hegemonia. Nesta hipótese, o
Estado-nação continua vigente, mas com significados diversos dos que teve por
longo tempo no pensamento liberal e no pensamento de algumas correntes
marxistas, sem esquecer sociais-democratas, neoliberais, fascistas e nazistas”.
(1) Por isso, é o ideal da paz universal deve ser realizado mediante processos
de globalização que levem em consideração “as conjunturas sociais e históricas
de cada um dos parceiros nacionais, convocados para decidir em pseudo-igualdade
de condições”.(2)
Neste breve ensaio, nos ateremos à teorização de um novo sistema
federativo mundial que, sob o prisma liberal neokantiano, compreenda o conjunto
específico das relações pluralistas, concernentes à escala de competências
envolvidas na consecução ou busca organizada do bem comum. Envolve-nos, a todos
deste presente estágio integrativo da humanidade, a busca da organização
jurídica desta rede complexa de relações articuladas entre unidades políticas
mais distantes e aquelas que estão melhor aproximadas do indivíduo. Assim
sendo, as pessoas jurídicas de Direito Internacional, especialmente as
coletividades estatais e as organizações de caráter regional, precisam
estruturar-se, dentro de uma funcionalidade sistêmica, que permita a realização
de arranjos políticos em níveis de poder local. Há, portanto, a necessidade de melhor
eficácia das decisões tornadas inoperantes em nível do poder central do Estado.
2 - A Necessidade de Redefinição da Atuação Estatal
A globalização permitiu que houvesse melhor controle dos
governantes pela sociedade internacional. Por outro lado, assistiu-se ao
enfraquecimento dos valores culturais e a emergência das graves crises de
moralidade. Além do mais, nós estamos sofrendo de um problema mundial
gravíssimo de desemprego, como resultado do avançado grau de desenvolvimento
tecnológico. E, ao que tudo indica, o Estado também padece de grave crise de
legitimidade, diretamente associada à profunda ineficácia das políticas
públicas adotadas.
Segundo
André-Noël Roth:
“a crise atual do Estado indica que os mecanismos econômicos, sociais e
jurídicos de regulação, postos em pé há um século, não mais funcionam. O Estado
Nacional já não está em capacidade de impor soluções, seja de um modo
autoritário ou seja em negociação com os principais atores sócio-políticos
nacionais, aos problemas sociais e econômicos atuais”.
Para Roth,
enfim, isso vem ocorrendo por causa da globalização que reduz a autonomia dos
Estados nos aspectos jurídicos, econômicos, políticos e militares de sua
soberania, criando-se uma interdependência entre eles, que “influi sempre mais na definição das políticas públicas internas de
cada Estado”. (3)
O resultado é que a soberania nacional vem-se
esvaindo, restringida que está pela integração econômica, num mesmo momento em
que os grandes grupos econômicos transferem as suas unidades de produção e os
sistemas financeiros realizam fabulosas transferências de capital.
Com isso, as engrenagens decisórias do Estado ficam
postas em xeque, redundando na desconcentração do aparelho estatal e na ruptura
do modelo de auto-suficiência interna.
Intriga-nos a presente situação, dentre outros fatos, porque
“nós crescemos com governos que absorveram para si
todos os monopólios do poder: não apenas o da violência física, mas também o da
capacidade de criação dos impostos e o de imposição de suas leis. Hoje isto
está mudando. A primeira razão seria porque os Estados não estão mais
claramente definidos a respeito de suas soberanias sobre o espaço físico e as
suas capacidades militares para defendê-lo. Através desta transformação
histórica, de um sistema de Estados governados para a guerra, a primazia de um
único nível (o nacional) desaparece, cedendo o seu lugar a diferentes níveis de
governo, do transnacional ao local, e que podem competir por lealdade, recursos
e poder. Porque sendo significante o senso de que os Estados têm decaído em
termos de suas capacidades e competências, há razões para que nós agora precisemos de autênticas revoluções que
coloquem estes Estados atualizados com o presente e ajudando-os a se livrar de
suas duas nítidas ‘escleroses’: a externa, de estarem retidos em grandes grupos
de interesse; e a interna de estarem retidos sobre anuladores modos
burocráticos de trabalho”.(4)
Em face da aparente impotência do Estado, diversas
atividades e responsabilidades passaram a ser assumidas internacionalmente,
para que recebam o concurso e a colaboração de atores não nacionais. As
interações transnacionais, neste caso, são as que mais reduzem ou restringem as
ações governamentais nos campos das atividades social e econômica. Por isso, os
Estados tiveram de aumentar o grau de integração política com as outras
coletividades estatais, buscando arranjos e instituições multilaterais para a
tentativa de controlar os efeitos desestabilizadores que acompanham o
desenvolvimento das interconexões globais. (5) Através da notória existência de aproximação dos Estados
nacionais, existe uma efetiva revolução em termos de maior eficácia jurídica do
Direito Internacional, constatada pelo incremento do poder das organizações
internacionais (ONU, União Européia, FMI,...). Além disso, é cada vez mais
intensa a progressão e a multiplicação dos tratados de cooperação econômica
(CEE, Mercosul, Nafta, Alca...), refletindo a permanente dinâmica do processo
globalizador.
3 - Emanuel
Kant e a sua Proposta Federalista de Paz Perpétua
O pensamento de Emanuel Kant sobre as relações internacionais age em congruência com o restante de suas concepções liberais em matéria de filosofia política, havendo deste modo de se realizar o embasamento na lei natural e na esperança de progresso moral da humanidade(6). Fundamentando-se em comando normativo capaz de por cobro definitivo à desordem existente na sociedade internacional, o posicionamento teórico kantiano entende ser necessária a intervenção de um novo poder internacional, deliberado segundo a razão federalista de conotação liberal, no sentido da eliminação das guerras entre os povos de todo o mundo.
Em Paz Perpétua, breve ensaio de 1795, Kant
propôs o seu clássico modelo de Federalismo
Mundial, segundo o qual buscaria alertar os homens ilustrados de sua época
para a necessidade da paz definitiva entre os Estados. Segundo o iluminista, as
coletividades estatais deveriam pactuar o término dos conflitos, em sentido
análogo ao que faziam os indivíduos se unirem contratualmente para a constituição
da sociedade civil. Tratava-se, outrossim, de verdadeiro imperativo categórico
estatal, a colaboração para o grandioso projeto moral de construção jurídica da
nova comunidade internacional (7), tendo por finalidade básica à visão
nitidamente hobbesiana de que “o estado de paz entre os homens vivendo lado
a lado não é o estado natural; porque o estado natural é um estado de guerra”.(8)
Na
realidade, o tom pessimista de Paz
Perpétua reflete, em larga medida, a situação dramática enfrentada pelos povos
da Europa em 1795, combalidos pelas guerras entre as grandes nações do Velho
Continente. Neste contexto, ao estado
natural de guerra se referia Kant às relações conflituosas entre as
potências européias, provindo exatamente deste fato a proposta da confederação
de Estados livres, em forma de Liga das Nações para a paz mundial.
O essencial do projeto de Paz Perpétua é a postulação de conquista
da liberdade universal alcançável através de regras de Direito que permitam a
harmonização da conduta externa de um determinado Estado, com a das demais
coletividades estatais. O que pretende Kant, outrossim, é realizar a
transplantação do ideário iluminista da lei como geradora de liberdade
individual, para a perspectiva do Direito conquanto instrumento pacificador das
relações entre os povos, por força do desenvolvimento de uma Constituição geral
dos Estados nacionais.
Na visão kantiana, se os
Estados permanecessem, no âmbito das relações internacionais desprovidos de
regras básicas, que em última análise são as que permitem a existência de
liberdade, eles continuariam a violar os direitos dos cidadãos, em função de
seus propósitos expansionistas. Assim sendo, como os Estados podem escravizar
as futuras gerações com dívidas de guerras e corromper a moralidade pública, a
realização de um autêntico Estado de Direito em nível internacional minimizaria
esta ameaça, mas estaria dependente da formação de uma nova ordem federativa
mundial, por Kant denominada de foedus
pacificum.
Hannah
Arendt, compreendendo magnificamente o posicionamento kantiano, observou que a
preferência do filósofo alemão pelo sistema confederativo para a sociedade
internacional, se devia pelo fato dele saber “perfeitamente bem que um governo
mundial – de caráter centralizador –
seria a pior tirania imaginável” (9). Por
isso, Kant postulou tão-somente a formação de uma ordem pluralista de
coletividades estatais soberanas, fundamentada na regulação jurídica das
relações federativas internacionais.
Descoberta a finalidade da paz perpétua como espécie de
princípio moral apriorístico, a cessação das hostilidades requereria o êxito do
acordo real, e não de uma mera
idealização desprovida de plena eficácia jurídica. Desse modo, o desejo
pacificador perpassaria a inexorável reorganização da sociedade internacional,
havendo de se destacar a importância do Direito como instrumento concretizador
do ideário de convivência pacífica e harmoniosa entre as nações.
Sofrendo do otimismo congênito que atinge a quase totalidade
dos liberais, Kant preservou uma visão extremamente positiva da natureza
humana. Por isso, chegaria mesmo a afirmar que o povo não se interessava pela
guerra. Com este argumento tomado como apriorístico,
mas que também é bastante questionável, muito embora gostaríamos de acreditar
sê-lo verdadeiro, o filósofo então pôde associar o ideal de paz ao processo,
segundo ele natural, de constituição do poder político internacional, de acordo
com os ditames categóricos de justiça.
Para Kant, a
guerra só não representaria um dano
menor do que o da formação de uma monarquia universal, aqui tomada numa visível
conotação de surgimento do Estado Unitário Mundial. Por outro lado, a
existência da pluralidade federativa de nações, conjuntamente a todos os
conflitos positivos engendrados, redundaria em maior veículo do progresso humano. Norberto Bobbio, por isso, atesta que a república de Kant não
apenas seria “a melhor forma de governo no que diz respeito às relações
entre o Estado e os cidadãos, mas também no que diz respeito às relações entre
os Estados”. Por que, segundo este raciocínio, um federalismo republicano “garantiria melhor do que qualquer outro,
internamente, a liberdade, e externamente a paz”, como “condição principal
daquela coexistência pacífica na liberdade ou livre na paz, que constitui o
ideal moral da espécie humana”.(10)
Acrescente-se
que o elitismo de Kant reservaria aos filósofos um papel de destaque na
formação do processo de paz e governança internacional. Em seu projeto
confederativo esteve incluída uma esdrúxula cláusula secreta que obrigava à
consulta dos filósofos. Esta deveria ser levada em conta pelos Estados
beligerantes, sob o pretexto de que, se o poder corromperia o livre julgamento
da razão, os filósofos, em sua “pureza de pombas”, poderiam de melhor forma se
contrapor à “astúcia das serpentes políticas”.(11)
Ademais,
se Kant foi o primeiro pensador de tipo federalista da Europa, havendo
postulado um modelo lato sensu de
federalismo mundial, mais propriamente confederativo, numa visão autônoma dos
valores e do curso da história, a sua concepção federativa era visivelmente
distorcida. Conforme expôs Lucio Levi sobre esta questão, em
“não tendo refletido sobre a natureza da inovação constitucional que
permitira a fundação dos Estados Unidos da América, não conhecia o
funcionamento do Estado federal e, portanto, não possuía os instrumentos
conceptuais para conceber, de uma forma real, a possibilidade de um Governo
democrático mundial capaz de limitar a
soberania absoluta dos Estados, mas que também por eles fosse limitado”.(12)
O projeto de federalismo
mundial a que se referia Kant, portanto, era na realidade simplesmente um
projeto de confederação mundial, porque os Estados permaneciam soberanos. Em
outras palavras, o filósofo não soube diferenciar federação de confederação,
que já era existente desde 1787, com a formação constitucional dos Estados
Unidos da América. (13)
De todo modo, Kant acabou se
tornando uma espécie de prisioneiro
da teoria unitária do Estado, de tanto temer “que a federação mundial
pudesse degenerar em tirania”. Nesse ponto, constata Lúcio Levi,
“todas as vezes que abordou o problema do poder político mundial foi
induzido a optar pelo seu ‘sucedâneo’ negativo, isto é, uma confederação de
Estados, que, mantendo a soberania absoluta de seus membros, perpetuaria a anarquia
internacional, que o Governo mundial teria que eliminar”.(14)
O temor de Kant em relação à
existência de governo mundial era perfeitamente justificável. O iluminista
almeja em seu projeto federalista o máximo da liberdade universal, que era
prejudicada pelas guerras entre os Estados. Somente o vínculo sócio-contratual
seria capaz de retirá-los desta espécie de estado
de natureza, legando à humanidade o constitucionalismo mundial de caráter
federativo. Mas a situação anárquica, típica deste estado de natureza entre as nações, ainda seria um mal
infinitamente menor do que o da formação do governo único mundial. Kant,
sensatamente, receava que um Estado unitário mundial pudesse legar o espectro
do despotismo sob todos os povos. Por isso, para ao mesmo tempo se evitar a
anarquia e o despotismo, gerando a paz e a liberdade, é que o iluminista
elaborou um projeto republicano e federalista de paz perpétua. (15)
4 - Por um Projeto Neokantiano de Federalismo Mundial
A
construção do sistema federativo mundial importaria em repartição racional de
competências, resultante em distinção e reconhecimento jurídico de unidades
políticas autônomas. Ficaria consubstanciado, ademais, através de medidas
consensuais de diferentes partes, permitindo-se a realização criadora das bases
lógico-racionais concernentes à formação de organizações políticas
supraestatais verdadeiramente voltadas à manutenção da paz mundial e cooperação
entre os povos. Tudo isso, contudo, em havendo de se respeitar o princípio da
subsidiariedade, de tal modo que o nível inferior de poder, aquele melhor
aproximado do indivíduo, jamais viesse a ser preterido aos níveis superiores de
poder.(16)
A contextualização da realidade policêntrica de
transformação do espaço público mundial indica que os Estados muito cedo se
transformarão em níveis intermediários de deliberação normativa e atuação
política. Outros níveis de poder surgirão com maior força, competindo
igualmente pela lealdade cívica dos cidadãos. E, tendo-se em vista o ambiente
de relações globais cada vez mais intensas, a teoria federalista denota a
possibilidade integradora da política em diferentes espaços societários da
humanidade. Por isso, nós ousaríamos até mesmo diagnosticar que o federalismo é
desideratum precipuo, quando se trata
de globalizar a política. A União Européia, outrossim, é prova mais que
contundente deste fato.
É
importante atestar, ademais, que a perspectiva do federalismo mundial coincide
perfeitamente com os princípios básicos da filosofia política de Tomás de
Aquino, assim como a de Aristóteles. Sob este prisma, a auto-suficiência, muito
embora relativa, é como uma propriedade essencial da sociedade perfeita, ao qual tende a humanidade inexoravelmente em
sua busca por formas políticas organizadas. Assim sendo, quando a paz e a
auto-suficiência não podem ser garantidas pela simples forma de poder local
(como, por exemplo, a Cidade-Estado) ocorre a necessidade da criação de outra
forma mais complexa (como, por exemplo, o Estado-nação).
A questão
básica, contudo, reside neste que é o problema crucial dos novos tempos, de se
saber se, dentro de sistemas globais, haverá espaço para a pluralidade e a
tolerância, alcançáveis pela composição federalista e do Estado de Direito, ou
se serão esmagadas todas as autonomias e adotada a forma tirânica, unitarista e
homogênea de governança mundial. Neste caso, a organização federativa da
política mundial adquire uma conotação quase salvadora, para a preservação das
liberdades fundamentais, tanto individuais quanto coletivas. Integradas num sólido
contexto jurídico de harmonização básica das diferenças, o sistema federalista
mundial respeitaria os interesses divergentes e somaria apenas os efetivamente
convergentes.
Assim sendo,
o debate federalista mundial perpassa a base moral e atinge a conjuntura
jurídica em sua plenitude, onde direitos e obrigações estatais precisam
compreender os paradigmas de paz perpétua e integração entre os povos. Os
Estados, neste aspecto, se tornam partes de um todo onde os elementos devem
permanecer livres em face não mais do jus
gentium, mas de uma verdadeira Lei
Fundamental, que consagraria ao mundo o dever de se proteger os direitos
fundamentais da pessoa humana e os limites do poder político.
5 - Considerações Finais
A procura de
um superestado mundial nada mais é do que a velha e fracassada utopia de
formação do Império universal. Esta mesma utopia que, diga-se de passagem, foi
diversas vezes almejada através do domínio imperial de uma única Nação. Adolf
Hitler tentou subjugar os povos não arianos. Antes dele o Imperador Napoleão
Bonaparte também tentou fazer o mesmo em proveito dos franceses. A tentativa
hodierna, visivelmente pacífica, não deve ser implementada mediante o domínio
imperial, mas exatamente por força normativa de um novo sistema federativo
mundial.
É mister,
portanto, que a sociedade internacional respeite as particularidades,
encontrando-se os mecanismos minimamente necessários de superação das
dificuldades ocasionadas pelo pretensioso mito da soberania nacional, que
tantos males tem causado à Humanidade. Deve-se, ademais, persistir quanto à
denúncia de todos os desvios éticos apresentados pelos maus governantes, bem
como no respeito às diferenças naturalmente existentes, para que estas não
resultem no egoísmo destrutível do pacto entre os povos para a consecução da
paz universal.
A aversão kantiana ao governo mundial é perfeitamente
justificável em sua magnífica sensatez, tendo-se em vista o nítido potencial
arbitrário, e até mesmo despótico, de todo o poder político. A garantia de
liberdade e justiça somente brotará quando as regras jurídicas internacionais
se revelarem seguras à promoção de certos princípios básicos de direito, que
saibam exatamente como preservar a pluralidade de interesses, bem como
instituir regras jurídicas, morais e, até mesmo, ecológicas, através das quais
seja processada a coexistência pacífica dos fenômenos sociais infinitamente
diversificados.
O que nos seduz na proposição desta idéia neokantiana de
federalismo mundial é, conforme nós já observamos, a possibilidade do oferecimento
de políticas ao mesmo tempo justas e pragmáticas, naquilo que é indispensável e
mesmo exigível dentro do contexto inexorável da presente globalização.
Acresça-se, portanto, o fato da nova prática política exigir a correlata
transformação das bases teóricas da modernidade, despertada para uma ordem
mundial interconectada e alimentadora constante dos mecanismos de abordagem
global.
Bibliografia:
ANDRADE, Régis de
Castro. “Kant: a Liberdade, o Indivíduo e a República”. In: Os Clássicos da Política.
Francisco Weffort (org.) – vol.2, São Paulo: Ática, 1996.
ARENDT, Hannah. Lições sobre a Filosofia Política de Kant.
Relume Dumará, 1997.
BOBBIO, Norberto. Direito e Estado no Pensamento de Emanuel
Kant. Brasília: ed. UnB, 1997.
FERREIRA, Gustavo
Sampaio Telles. “A Paz Perpétua no Pensamento Kantiano e os Fundamentos de um
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III, nº 3, nov. / 2000.
HELD, David. A Democracia, o Estado e o Sistema Global.
Lua Nova - nº 23, mar./1991.
IANNI, Octavio. Teorias da Globalização. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.
KANT, Emmanuell. Projet de
Paix Perpetuelle, trad.: J. Gibelin, Paris, Librarie Philosophique
J. Vrin, 1947.
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N. Bobbio, N. Matteucci e G. Pasquino, (org.), vol. I, Brasília: ed. UnB, 1997.
MULGAN, Geoff. Life After
Politics – New Thinking for the Twenty-first Century. London:
Fontana Press, 1997.
REALE, Miguel. De Olhos para o Brasil e o Mundo.
Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1997, p. 93.
RILEY, Patrick. “Federalism in Kant’s Political Philosophy”. In: Federalism as Grand Design – Political Philosophers and Federal
Principle. Daniel J. Elazar
(org.) University Press of America – Center for the Study of Federalism.
RÖTH, André-Noel. “O
Direito em Crise: Fim do Estado Moderno?” in: Direito e Globalização Econômica. José Eduardo Faria (org.).
São Paulo: Malheiros, 1996.
1 - in
Teorias da
Globalização. Rio de Janeiro, ed. Civilização Brasileira, 1996, p.
40.
2 - Cf. Miguel Reale, in De Olhos no Brasil e no Mundo. Rio de
Janeiro, ed. Expressão e Cultura, 1997, p. 93.
3 - in “O Direito em Crise: Fim
do Estado Moderno?”, do livro Direito
e Globalização Econômica. org.: José Eduardo Faria, São Paulo: ed. Malheiros, 1996, p.18.
4 - Cf.: Geoff Mulgan, in Life After
Politics - New Thinking for the Twenty-first Century. London,
Fontana Press, 1997, p. XV.
5 - Cf.: David Held, in A
Democracia, o Estado e o Sistema Global. Lua Nova - nº 23, março de
1991, p.159.
6 - Regis de Castro
Andrade, nestes termos, faz a seguinte observação: “O Pensamento kantiano sobre as relações entre os Estados nacionais não
destoa arquitetonicamente de sua filosofia política. Mas nele se produz um
deslocamento de ênfase. A história se desenrola, é verdade, segundo a lei
natural do progresso moral; mas a intervenção política deliberada segundo à
razão faz-se necessária para que se evitem as guerras”. – in “Kant: a Liberdade, o Indivíduo e a República”; do livro Os Clássicos da Política - vol. 2,
org.: Francisco Weffort, São Paulo: ed. Ática, 1996, p.68.
7 - “Les
Peuples, en tant qu’Etats, peuvent être jugés comme des individus ; dans
leur état de nature (c’est-à-dire indépendants de lois extérieures) ils se lèsent
mutuellement déjà du fait qu’ils sont voisins et chacun, en vue de as securité,
peut et doit exiger de l’autre, qu’il se soumette avec lui à une constitution,
semblable à la constution civile où chacun peut voir son droit garanti. Ceci
constituerait une féderation de peuples (Volkerbund) qui ne serait pas
néanmoins nécessairement un Etat fédératif (Völkerstaat)” – Emmanuel Kant, in Projet de Paix
Perpétuelle. Trad.: J. Gibelin, Paris, Librarie Philosophique J.
Vrin, 1947, p. 22.
8 - “L’état de paix entre des hommes
vivants côte-à-côte, n’est pas un état de nature (status naturalis); celui-ci
est bien plutôt un état de guerre” – idem, p. 13.
9 - in Lições sobre a Filosofia Política de Kant. ed. Relume Dumará,
1997, p.58.
10 - in
Direito e
Estado no Pensamento de Emanuel Kant, Brasília: ed. UnB, 1997, p.
162.
11 - Cf.
Paix Perpetuelle, ob. cit., pp. 116-117.
12 - in
“Federalismo”, verbete do Dicionário de Política - vol.II,
orgs.: N. Bobbio, N. Matteucci e G. Pasquino, Brasília: ed. Unb, 1997, p. 479.
13 - Gustavo Sampaio
Telles Ferreira traz luz à questão: “A
Federação a que se refere o filósofo do Estado Liberal corresponderia, isto
sim, a uma Confederação, seja pelo direito de secessão por parte do Estado,
seja pelo fato de não se ter criado a idéia de um poder central, preservando-se
assim a soberania de cada integrante da união. Não se tratava, por conseguinte,
de um União de Direito Constitucional, mas de uma União de Direito
Internacional, calcada em um sistema de coordenação de vontades políticas, cujos
pilares contratuais se apoiariam apenas sobre uma limitação consentida do poder
soberano de cada Estado-membro para a consecução de fins comuns. Isto servirá,
mas adiante, de elemento de ligação entre o Projeto de Paz Perpétua e a idéia
de jurisdição universal”. – in A Paz Perpétua no Pensamento Kantiano e os
Fundamentos de um Tribunal Penal Internacional Permanente. Revista
Interdisciplinar de Direito da Universidade de Valença, Ano III, nº 3, novembro
de 2000, p. 126.
14 - ob. cit.,
p. 480.
15 - Para encerrar esta análise, resolvemos expor os seguintes
comentários de Patrick Riley, professor da Universidade de Wisconsin-Madison,
sobre a visão kantiana de federalismo mundial: “Kant, then, rejects internal or domestic federalism within particular
states; but in the end the most striking thing about his international
federalism, his foedus pacificum, is
that the stability of national states depends on it. Kant’s national states,
indeed, without being federal, need federalism. The uniqueness of his system is
the interlocking character of law and
public order on all planes, the mutual need of republican constitutionalism and international
federalism for each other, and the dependence of constitutionalism itself on
peace through international lawfulness. Kant, then, is a federalist, as he is often taken to be (...) insofar
as the possibility of morality, of respect for persons as ends in
themselves, turns on a context of public
legal justice which is secured and
stabilized by a universal foedus pacificum. If, then, as Kant urges, the good will which constitutes morality is a jewel which shines by its own light, and if national law is the setting which supports it, then a federal eternal
peace is literally and figuratively the crown of Kant’s practical philosophy”.
– in Federalism in Kant’s Political
Philosophy, do livro Federalism as Grand Design – Political Philosophers and
the Federal Principle. org.: Daniel J. Elazar, University Press of
America – Center for the Study of Federalism, p. 106.
16 - Cf.: David Held, ob. cit., p. 154.
Resumo:
Em 1795, Kant escreveu A Paz Perpétua, propondo o filósofo alemão um modelo
de federalismo mundial correspondente à necessidade vislumbrada de paz definitiva
entre os Estados. Nestes dias angustiantes de globalização, relativização
dos valores éticos, terrorismo, e até mesmo a ameaça concreta de conflito
nuclear, a análise do projeto federalista kantiano se afigura como mais necessária
do que nunca.
Palavras-chave: globalização, Kant, liberalismo político, federalismo mundial,
paz perpétua.
Abstract:
On 1795, Kant had written his Perpetual Peace, in which the German philosopher
proposed an interesting model of world federalism, and corresponding to the
necessity of a definitive peace among nation-states. As a matter of fact,
over these days of globalization, absence of moral values, terrorism and also
a real threaten of nuclear war, an analysis on the Kantian federalist project
is more necessary than has ever been before.
Keywords: globalization, Kant, political liberalism, world federalism, perpetual
peace.